sexta-feira, 2 de agosto de 2024

COSTENARO X BREAK: A REALIDADE DO RIO DE JANEIRO NÃO PODE SER ROMANTIZADA!

COSTENARO X BREAK:
A REALIDADE DO RIO DE JANEIRO NÃO PODE SER ROMANTIZADA!


No dia 23 de julho de 2024, o influenciador político Gabriel Costenaro, militante do MBL (Movimento Brasil Livre) publicou um vídeo questionando o conteúdo feito pelo influenciador Break. No vídeo em questão, ele diz que Break é um “picareta”, visto que ele, indiretamente, pode estar fazendo apologia ao tráfico e à bandidagem. Break postou uma vídeo, aos prantos, dizendo que tem sofrido, que tem sido julgado, acusado de associação ao crime, que está sendo saco de pancada, e que seu objetivo é “passar alegria” para os seguidores.
 
Fato é que tanto Break quanto Costenaro têm razão nos seus questionamentos.
 
Break relata a realidade das comunidades (ou parte dela) em forma de humor, sátira.  Como escreveu calebe.oliveiraa:
‘Coé Costenaro, gosto muito de tu, mas acho que tu deu uma viajada legal... O Break dá umas dicas do que não fazer em favelas ou mesmo nos centros urbanos, não vejo nenhum tipo de romantização do tráfico. Inclusive tem relatos de pessoas que seguiram as dicas dele ao entrar por engano em uma comunidade. Tu pode questionar o fato dele ter divulgado cassino online, mas dizer que o muleque tá incentivado o tráfico? Na moral... viajou grandão!”
 
Mas como respondeu Costenaro:
‘ele já fez vários vídeos que a polícia esculacha morador, agora me dê um vídeo dele falando das covardias que os traficantes e milicianos fazem com os moradores. Bora lá?’
 
E isso é real! Você, provavelmente, nunca verá morador de comunidade questionado, reclamando de bandidos. Os bandidos podem fazem o que for, que os moradores nunca levantarão a voz para questionar. Mas, se a polícia comete um erro, desce todo mundo.
 
O questionamento de Costenaro tem todo sentido: Break, com suas publicações, pode estar romantizando, direta ou indiretamente, a situação terrível que hoje vivenciamos no Rio de Janeiro. A partir do momento que um influenciador com milhões de seguidores dá dicas de como não se “tornar saudade”, isso pode influenciar. A partir do momento que um influenciador com milhões de seguidores diz que bandidos colocam racistas no micro-ondas, isto pode influenciar. Além disso, o brasileiro é visto como corruptível. O carioca, mais precisamente, é visto como desonesto, ladrão, bandido, vigarista, trapaceiro e malandro, que, sempre quando pode, passa a perna nos outros. A partir do momento que um influenciador com milhões de seguidores faz uma “brincadeira” vendendo produtos mais caros para turistas, tirando proveito da situação, isto realça nossos adjetivos.
 
‘Cultura de favela acabou com rio de janeiro.’ (Glauber Braga)
 
‘Costenaro trouxe uma reflexão que muitas pessoas estão longe de conseguir mensurar a importância! O ponto mais importante aqui é a romantização do crime. Ou você acha mesmo que é normal ter tiroteios e assaltos constantes em bairros que, em sua grande maioria, são resididos por pessoas de baixa renda? Parabéns por trazer essa conscientização para o povo que é oprimido pelas milícias e pelas facções.’ (Nicola Aguila)
 
‘Meu??? Qual q é da fita do MBL? Criticando td e todos p ver se ficam se apoio? Ainda bem q eu nunca acreditei q eram liberais de verdade. Vai criticar os branquelos q tão fzndo isso. Mlk nasceu na Rocinha, viu uma oportunidade q se ele n pegasse outro ia pegar, não é ilegal e ele ta fazendo. Coisa q qqr um faria.’ (Leonardo Matos)
 
‘Fui criado na favela e nunca achei legal essas práticas dos ‘amigos’ igual ele gosta de romantizar.’ (Brunno de Luca)
 
‘Sou de outro estado e vou ser bem sincero: os vídeos do break me dão uma imensa vontade de nunca pisar no Rio de Janeiro.’ (Matheus)
 
Nas redes sociais de ambos têm se discutido a suposta ‘romantização da cultura de favela’. Eu acho que muitas pessoas precisam sair da bolha que vivem para tentar enxergar outros horizontes. Vivemos em um país diverso. Não existe só Bossa Nova, Samba e MPB. Existem n formas de se fazer arte. Nossa cultura é diversa. Porém, vivemos numa sociedade preconceituosa onde o que vem da comunidade é visto como lixo, imoral, vulgar. O que muitas pessoas julgam como ‘romantização’, eu vejo como resistência.
 
O antropólogo brasileiro Roque Laraia define cultura como: o modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e mesmo as posturas corporais são assim produtos de uma herança cultural, ou seja, resultado da operação de uma determinada cultura. O Brasil, que é um país com dimensões continentais, possui culturas diversas, regionais, e todas juntas, constituem a nacional. Porém, por sermos uma sociedade desigual, há uma classificação entre boa e ruim, certa ou errada e, muitas vezes, a cultura da favela é vista de forma distorcida e criminalizada. Grafite, passinho, rap, funk, teatro, rodas de samba, são algumas das manifestações culturais que afirmam as características de um grupo que, através da arte, sobrevive, ajuda suas famílias, educa e mostra ao mundo que a favela, mesmo não sendo reconhecida pelo estado, produz conteúdos importantíssimos para a reflexão humana, além do potencial como produtora cultural.
 
Link: https://vozdascomunidades.com.br/geral/31826/#:~:text=Grafite%2C%20passinho%2C%20rap%2C%20funk,conte%C3%BAdos%20important%C3%ADssimos%20para%20a%20reflex%C3%A3o
 
A diversidade cultural talvez seja um sinônimo de Brasil, mas apesar disso enfrentamos questões relacionadas à liberdade de expressão. A desigualdade, discriminação e a falta de politicas publicas eficazes continuam a ser o maior desafio na garantia de liberdade e harmonia entre grupos culturais. Vivemos em nossa sociedade, emaranhados em uma teia de saberes e manifestações culturais, e tendemos a selecionar e delimitar, de forma quase imprudente ou inconsciente, por meio de diversos fatores como a escola, veículos midiáticos, etc., o que é ou não digno de ser salvaguardado. Ao falar de patrimônio cultural, há sempre um pensamento pré-determinado do que seria, ou não, parte importante dos monumentos e práticas a serem preservadas. Nesse sentido, o processo de colonização ocorrido nas Américas e principalmente no Brasil é um fato histórico fundamental para entender como a memória é delimitada para caber em um arranjo histórico pré-definido.
Link: https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/vozes-da-quebrada-a-favela-como-patrimonio-cultural/
 
As comunidades não deixarão de existir. Logo, quem ali mora tem que achar um jeito de sobreviver e viver a vida. Se o funk é a forma que muitos escolheram para sair da realidade, por que não pode!? É claro que existe o outro lado: a arte sendo usada para o mau. Quantos MCs, por exemplo, em suas músicas e shows fazem, realmente, apologia ao tráfico.

Conclusão:
O erro de Costenaro foi tentar colocar Break como uma pessoa ruim, que passa pano para a bandidagem. O fato dele (e dos moradores de comunidades) não reclamarem dos bandidos já é um alerta de como funciona a comunidade. Lá tem regras e os moradores têm que seguir. Esta é a realidade do Rio de Janeiro.
 
E o erro de Break é, direta ou indiretamente, banalizar, romantizar e até justificar a barbárie que os cariocas vivem.
 
Raphael Paiva

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