COSTENARO X BREAK:
A REALIDADE DO RIO DE
JANEIRO NÃO PODE SER ROMANTIZADA!
No dia 23 de julho de 2024, o influenciador
político Gabriel Costenaro, militante do MBL (Movimento Brasil Livre) publicou
um vídeo questionando o conteúdo feito pelo influenciador Break. No vídeo em
questão, ele diz que Break é um “picareta”, visto que ele, indiretamente, pode
estar fazendo apologia ao tráfico e à bandidagem. Break postou uma vídeo, aos
prantos, dizendo que tem sofrido, que tem sido julgado, acusado de associação
ao crime, que está sendo saco de pancada, e que seu objetivo é “passar alegria”
para os seguidores.
Fato é que tanto Break quanto Costenaro têm razão
nos seus questionamentos.
Break relata a realidade das comunidades (ou
parte dela) em forma de humor, sátira.
Como escreveu calebe.oliveiraa:
‘Coé
Costenaro, gosto muito de tu, mas acho que tu deu uma viajada legal... O Break
dá umas dicas do que não fazer em favelas ou mesmo nos centros urbanos, não
vejo nenhum tipo de romantização do tráfico. Inclusive tem relatos de pessoas
que seguiram as dicas dele ao entrar por engano em uma comunidade. Tu pode
questionar o fato dele ter divulgado cassino online, mas dizer que o muleque tá
incentivado o tráfico? Na moral... viajou grandão!”
Mas como respondeu Costenaro:
‘ele já
fez vários vídeos que a polícia esculacha morador, agora me dê um vídeo dele
falando das covardias que os traficantes e milicianos fazem com os moradores.
Bora lá?’
E isso é real! Você, provavelmente, nunca verá
morador de comunidade questionado, reclamando de bandidos. Os bandidos podem
fazem o que for, que os moradores nunca levantarão a voz para questionar. Mas,
se a polícia comete um erro, desce todo mundo.
O questionamento de Costenaro tem todo sentido:
Break, com suas publicações, pode estar romantizando, direta ou indiretamente,
a situação terrível que hoje vivenciamos no Rio de Janeiro. A partir do momento
que um influenciador com milhões de seguidores dá dicas de como não se “tornar
saudade”, isso pode influenciar. A partir do momento que um influenciador com
milhões de seguidores diz que bandidos colocam racistas no micro-ondas, isto
pode influenciar. Além disso, o brasileiro é visto como corruptível. O carioca,
mais precisamente, é visto como desonesto, ladrão, bandido, vigarista,
trapaceiro e malandro, que, sempre quando pode, passa a perna nos outros. A
partir do momento que um influenciador com milhões de seguidores faz uma
“brincadeira” vendendo produtos mais caros para turistas, tirando proveito da
situação, isto realça nossos adjetivos.
‘Cultura
de favela acabou com rio de janeiro.’ (Glauber Braga)
‘Costenaro
trouxe uma reflexão que muitas pessoas estão longe de conseguir mensurar a
importância! O ponto mais importante aqui é a romantização do crime. Ou você
acha mesmo que é normal ter tiroteios e assaltos constantes em bairros que, em
sua grande maioria, são resididos por pessoas de baixa renda? Parabéns por
trazer essa conscientização para o povo que é oprimido pelas milícias e pelas
facções.’
(Nicola Aguila)
‘Meu???
Qual q é da fita do MBL? Criticando td e todos p ver se ficam se apoio? Ainda
bem q eu nunca acreditei q eram liberais de verdade. Vai criticar os branquelos
q tão fzndo isso. Mlk nasceu na Rocinha, viu uma oportunidade q se ele n
pegasse outro ia pegar, não é ilegal e ele ta fazendo. Coisa q qqr um faria.’ (Leonardo Matos)
‘Fui
criado na favela e nunca achei legal essas práticas dos ‘amigos’ igual ele
gosta de romantizar.’
(Brunno de Luca)
‘Sou de
outro estado e vou ser bem sincero: os vídeos do break me dão uma imensa
vontade de nunca pisar no Rio de Janeiro.’ (Matheus)
Nas redes sociais de ambos têm se discutido a
suposta ‘romantização da cultura de favela’. Eu acho que muitas pessoas
precisam sair da bolha que vivem para tentar enxergar outros horizontes.
Vivemos em um país diverso. Não existe só Bossa Nova, Samba e MPB. Existem n
formas de se fazer arte. Nossa cultura é diversa. Porém, vivemos numa sociedade
preconceituosa onde o que vem da comunidade é visto como lixo, imoral, vulgar.
O que muitas pessoas julgam como ‘romantização’, eu vejo como resistência.
O
antropólogo brasileiro Roque Laraia define cultura como: o modo de ver o mundo,
as apreciações de ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos
sociais e mesmo as posturas corporais são assim produtos de uma herança
cultural, ou seja, resultado da operação de uma determinada cultura. O Brasil,
que é um país com dimensões continentais, possui culturas diversas, regionais,
e todas juntas, constituem a nacional. Porém, por sermos uma sociedade
desigual, há uma classificação entre boa e ruim, certa ou errada e, muitas
vezes, a cultura da favela é vista de forma distorcida e criminalizada. Grafite,
passinho, rap, funk, teatro, rodas de samba, são algumas das manifestações
culturais que afirmam as características de um grupo que, através da arte,
sobrevive, ajuda suas famílias, educa e mostra ao mundo que a favela, mesmo não
sendo reconhecida pelo estado, produz conteúdos importantíssimos para a
reflexão humana, além do potencial como produtora cultural.
Link: https://vozdascomunidades.com.br/geral/31826/#:~:text=Grafite%2C%20passinho%2C%20rap%2C%20funk,conte%C3%BAdos%20important%C3%ADssimos%20para%20a%20reflex%C3%A3o
A
diversidade cultural talvez seja um sinônimo de Brasil, mas apesar disso
enfrentamos questões relacionadas à liberdade de expressão. A desigualdade,
discriminação e a falta de politicas publicas eficazes continuam a ser o maior
desafio na garantia de liberdade e harmonia entre grupos culturais. Vivemos em
nossa sociedade, emaranhados em uma teia de saberes e manifestações culturais,
e tendemos a selecionar e delimitar, de forma quase imprudente ou inconsciente,
por meio de diversos fatores como a escola, veículos midiáticos, etc., o que é
ou não digno de ser salvaguardado. Ao falar de patrimônio cultural, há sempre
um pensamento pré-determinado do que seria, ou não, parte importante dos
monumentos e práticas a serem preservadas. Nesse sentido, o processo de
colonização ocorrido nas Américas e principalmente no Brasil é um fato
histórico fundamental para entender como a memória é delimitada para caber em
um arranjo histórico pré-definido.
Link: https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/vozes-da-quebrada-a-favela-como-patrimonio-cultural/
As comunidades não deixarão de existir. Logo,
quem ali mora tem que achar um jeito de sobreviver e viver a vida. Se o funk é
a forma que muitos escolheram para sair da realidade, por que não pode!? É
claro que existe o outro lado: a arte sendo usada para o mau. Quantos MCs, por
exemplo, em suas músicas e shows fazem, realmente, apologia ao tráfico.
Conclusão:
O erro de Costenaro foi tentar colocar Break
como uma pessoa ruim, que passa pano para a bandidagem. O fato dele (e dos
moradores de comunidades) não reclamarem dos bandidos já é um alerta de como
funciona a comunidade. Lá tem regras e os moradores têm que seguir. Esta é a
realidade do Rio de Janeiro.
E o erro de Break é, direta ou indiretamente,
banalizar, romantizar e até justificar a barbárie que os cariocas vivem.
Raphael Paiva
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